À moda Adélia Prado

Entre almoços de domingo,

bolos e cafés fumegantes,

encontro conforto, propósito.

De mim, distraio-me.

Abafo os teimosos pensamentos

com o apito da chaleira.

Raspo a sujeira dos pratos

como quem arranca as cascas das chagas do corpo.

Desce pelo ralo a água da louça suja,

que consigo leva as ilusões de anteontem,

de há dois meses, de há dois anos.

Espano, cautelosa, a mobília.

Receio encontrar cartões velhos ou retratos.

Temo a violência das lembranças.

Calejada, resguardo-me, evito os gatilhos.

Deixo em paz os ausentes.

Não convém remexer baús empoeirados nem águas assentadas.

Contribuição do poeta Jota Garcia, que tanto enriquece minha experiência aqui no Recanto:

VELHAS MEMÓRIAS

Velhas memórias de um triste passado,

Melhor que não as despertes agora.

Pode ser que não seja a melhor hora

De mexer naquilo que foi guardado.

Se te deixam ferido, magoado,

Algumas marcas seguem tempo afora.

Um ferimento nunca vai embora,

E sempre sangra quando é tocado.

Nem abre a velha caixa que as guarda

Da visão de algum olhar curioso.

Mantém a distância, fica afastado,

As más lembranças podem machucar.

São bombas de efeito danoso,

À simples visão podem detonar.

Miss Araújo
Enviado por Miss Araújo em 22/09/2022
Reeditado em 23/09/2022
Código do texto: T7612230
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