testamento

Sou o cheiro dos livros desesperados

das histórias não contadas

das histórias esquecidas

das histórias interrompidas

nas frases inconclusas

Sou a saudade

na beira do cais

Do barco que parte

e leva a alvorada

o sol nascente da minha vida

Sou a estrela na noite escura

das ruas desertas

das casas desabitadas

dos amores esquecidos

Sou a carta não escrita

Sou a lágrima bendita

Sou o pingo no I

da incerteza que é viver

Sou o próxima que virá

e comtemplará o sorriso

da criança que chega

Sou tantos

e nada ao mesmo tempo

Porque em cada ser

que nasce

um pedaço de mim também nasce

Sou o livro esquecido

O amor não respondido

Sou a certeza da incerteza

Sou o cheiro dos livros desesperados

dos negros arrancados de suas terras

Separados de suas vidas

Sou os filhos sem pais

as viúvas e seus mortos maridos

Sou os velhos esquecidos

das memórias juvenis

Sou o início e o fim

de tudo o começo

o caroço da manga

da fruta que cai

do pé e a mata que queima

Sou o rio areado

um dia caudaloso

areado e seco

das maquinas que cortam

as gigantes árvores

guardiãs das florestas

Sou o cheiro dos livros desesperados

esquecidos nos bancos

das praças e ônibus que partem