O CORPO AINDA POSSUI
Pão duro, boca mole.
Faca afiada, olhos cegos.
Vesgos vícios, sãs desejos.
O corpo ainda possui a pele que enruga
Que serve de abrigo à pulga.
Cabeça feita, ventre inacabado.
Pés descalços, tênis importado.
Carro blindado, carroça sem porta.
O corpo ainda possui o formato do aparato
Que se rompe depois de um ato.
Comida quente, fome congelada.
Banheiro com Box até o teto, bostas no chão.
Cabelos escovados, cérebros encharcados.
O corpo ainda possui vísceras e gestos
Que se desfaz em restos.
Bunda grande, cabeça pequena.
Alma doce, espírito amargo.
Reações alérgicas, loucuras lisérgicas.
O corpo ainda possui formas e feridas
As “cicatrizes” ingeridas.
A bebida corrosiva, o paladar voraz.
O grito cheio no escuro, a voz vazia no claro.
A santa de gesso, A fé de porcelana.
O corpo ainda possui os cultos e os pulsos
Que um dia tornam-se os “vultos”.
O dia amarelo, a noite negra.
A palidez da lua, os raios de sol.
Comida caseira, lavagem aos porcos.
O corpo ainda possui moldes e molduras
Que apodrece como frutas maduras.