Alcione

Inaugurei o útero de minha mãe.

Se antes em outro plano eu me encontrava, não sei.

Acredito que buscava pouso em barriga cativa, e encontrei.

Nasci em terreno inóspito.

Impróprio era meu porvir a este mundo.

Um projétil que já sai da arma em estilhaço.

O deserto que atravessei ainda na barriga, vim a encontrar de novo em vida.

Saí perfeita. 20 dedos inteiros e um paradeiro seguro

no colo que me emprestou o útero.

Carrego meu corpo magro e translúcido por caminhos que já conheço.

Repito pegadas enquanto envelheço.

Faço-me capaz de cuidar da criança ferida.

Sem grandes alardes sigo na trilha de areia e brita.

Não raro um calçamento de cidade grande me confunde, onde?

Onde estarei logo adiante?

Não sei, e isso é torturante.

As estrelas que brilham aos olhos meus, não estão mortas.

E se de fato o tempo nos impõe a estranheza do imensurável,

em alguns milhões de anos poderei eu ser poeira cósmica, cascalho lunar

rabiola de cometa, constelação do zodíaco.

Um objeto voador não identificado.

Um ser iluminado que virá de Alcyone para enfrentar a fúria de ciclones

e o desespero dos desenganados.

Mas por hoje, sou apenas um nome.

Uma Oliveira que não gosta de azeitonas.

E o nome do útero? Alcione.

@literuaitura