Pássaro branco
Um pássaro branco, colosso arredio
Pousa em meu peito, plúmbeo pássaro
de denso vazio.
Seu peso sufoca-me
intolerável leveza do silêncio
Mudez taciturna, noturna iguaria de fel
Tuas largas, gordas largas plumas
Me aprumam em crepuscular névoa soturna,
Deste breve dissabor da incompletude,
Pálida lacuna a roubar-me o vigor e
romper o alento, pungente peso do hiato
que censura o afago
da vida e do tempo.
O fato, é que não brado
palavra ou mudez indulgente,
não anuncio a glória ou
descenso presente
Presença esta, única, do pássaro branco
que reina em meu peito.
Em vã intenção de extirpá-lo
e findar o pesar, rijo fardo,
miro, feroz, um punhal bravio:
Desfaz-se o pássaro em tenaz vazio.
Atinjo, aflitiva lança, em meu peito indigente
A ferida da ira: só tange a quem sente.
Refaz-se, em grandeza, este pássaro
Íntegro, como se jamais lhe houvessem tocado
Compreendo, então, com clareza
Que a vacuidade perfaz sua essência
esculpido sem matéria,
habitando sem espaço.
Realiza-se na ausência. Reina o nada.
Esse pássaro, gigante inexistente:
É a falta.