Um dia...
(1)
Então é assim:
um dia eu me vou
num pijama de madeira,
não tem jeito nem maneira.
A questão é:
quanto tempo levará
para se esquecerem de mim?
(2)
Um dia as cortinas irão se fechar
e vão me separar de vez da plateia.
Com o espetáculo final acabado,
só eu saberei o que tem dos dois lados.
(3)
Um dia um poeta morto me disse:
vai, João, escreve aí
mesmo que sejam tolices.
Canta teus amores,
fala das flores.
Revela os segredos das vadias,
tão cheias de amor,
e de pudor tão vazias.
Fala das misérias do mundo
e também dos vagabundos,
dos que sofrem os reveses vida,
expondo as chagas e as feridas.
Diga, João,
como sofre um coração
que ama sem ser amado.
A ninguém julgues inocente ou culpado,
deixa isso para os tribunais.
E quando nada mais
tiveres para dizer,
lembra-te dos outros e de mim
e escreve em letras garrafais
FIM.
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Na ilustração, Teatro do Ginásio Alemão em Paris de Adolph Menzel (Polônia, 1815 – Alemanha, 1905).