O elefante azul

Certa manhã, de um dia despretensioso,

tomei meu puçá de capturar poesia

e saí sem rumo certo;

deixando a sorte me guiar,

adentrei por uma praça

pois praça é lugar bom pra capturar poesia;

e não é que minha sorte estava certa!

no meio da praça, um elefante azul

tocava a Ave Maria de Schubert

em uma gaita de fole.

Talvez seja a coisa mais extraordinária que já vi.

Um elefante azul!

Tocando Schubert!

Numa gaita de fole!

Voltei pra casa ansioso,

precisava contar para alguém;

tentei contar para minha esposa

mas ela não me ouvia,

despejou um monte de reclamações:

que eu tinha que consertar a pia da cozinha,

trocar o óleo do carro,

que ela estava atrasada, tchau.

Liguei pra minha mãe mas ela tinha médico.

Tentei contar pra minha filha mas ela teria prova, precisava estudar.

Liguei pra um amigo mas o casamento dele ia mal.

Eu vi algo extraordinário, precisava compartilhar com alguém,

mas ninguém queria ouvir.

Saí para a rua e sentei-me ao lado de um mendigo.

Quando me dei conta, já lhe havia narrado toda a história sobre o extraordinário.

Ele ouviu tudo com atenção, sem interromper-me,

então disse-me que é preciso estar desapegado do desimportante para ver o extraordinário,

que as pessoas têm muitas coisas mas não têm nada

e que os milagres só se mostram aos que os querem ver.

Acabamos eu, o mendigo e o elefante azul

dançando frevo no meio da praça debaixo de chuva.

Quem passava não entendia nada.