POST MORTEM
Não há além depois de mim
e minha alma é tão recente quanto eu
Já são tantas e tamanhas as ardências
que trago no peito e no pulsar das veias
o que nenhum inferno me há de ter reservado
Ninguém me esperará depois de mim
sequer meus mortos ou minhas lembranças
pois no despejado azul do céu
não habitam anjos ou querubins
apenas pássaros que voam
indiferentes e alheios
à romaria terrena dos homens vagos
São muitos os abandonados
assim como muitos abandonarei
mas quando nada mais restar
exceto a mudez das minhas memórias
e o vácuo geométrico da ausência
estarei quem sabe escondido
do meu rosto e da minha face
em um lugar que não existe
a não ser na exaustão dos sonhos
jamais consumados
E por fim
quando o fim vier
no fechar derradeiro das pálpebras
não haverá o encerrar de cortinas
nem o silenciar surdo dos aplausos
mas tão somente e apenas
o fechar deste rápido e estreito parêntesis
por onde pequeno transitei
Não há além depois de mim
e a vida é tão precoce quanto eu