Emoção

Emoção

maria da graça almeida

Nasci feitinha de mar.

Marinha, era a água salgada

que me corria nas veias,

vazando descompassada

em noites de lua cheia.

Era um mar bem antigo,

tormentoso, incontido

que já nascera comigo

nas entranhas escondido.

Ouvia eu inda bebê

cantigas pra adormecer

e sob o embalo da mãe

todo meu mar escorria

e salgada como a lágrima,

muita água me descia.

Minha mãe, enternecida,

julgava que seu entoar,

tanto me emocionava

que, com trejeitos e graça,

devargarzinho eu chorava.

Pus-me a dar como certa

a materna fantasia

e assumi toda a roupagem

de pessoa emotiva.

Por muito tempo segui

a verter solto meu mar,

toda vez que perto ouvia

um doce ou triste cantar.

E assim imenso esse mar

sempre tão pronto a vazar

mais se fazia abundante

e um tolo choramingar

tornou-se choro constante.

Hoje meu mar já enxuguei,

gotas salgadas sequei,

a resgatar certos versos

que, entre balanço e lágrimas,

agonizavam submersos.

maria da graça almeida
Enviado por maria da graça almeida em 23/03/2005
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