O CICLO DA VIDA

Da infância trago

a capacidade do assombro

o jeito brincante

a curiosidade bisbilhoteira

a ousadia menina

e a solidão de filho único

Da puberdade herdei

a introversão pensante

os arroubos e os arrebatamentos

agora desencarnados

assim como o tamanho do pé

e o número do meu calçado

Da juventude conservo

a rebeldia obstinada

a indocilidade travessa

a chama olímpica pela procura

a insatisfação motivante

o amanhã distante

e a esposa com quem me casei

Da maturidade prossigo

lendo livros que ainda não li

reverenciado meus sumidos

me assossegando de serotoninas

e confessando os pecados necessários

que me tornaram naquilo que me tornei

Da velhice aguardo

o neto crescer

reler os livros que já li

conversar com meus pais

contemplar crianças brincando

vadiar com a memória sentado

e ter a consciência e a certeza

de que tudo passa lá para trás

e que nem o ontem me é para sempre

Quando eu morrer

vou me visitar no cemitério

no dia reservado aos finados

Joaquim Cesário de Mello
Enviado por Joaquim Cesário de Mello em 23/04/2022
Reeditado em 23/04/2022
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