ELA, OS PEÕES E OS OUTROS
Acontece uma conversa filosófica e honesta sobre a vida, nas
sessenta e quatro casas que abrigam esporte, ciência, arte.
Xadrez é poesia na arte que seu poeta cria.
É também a lógica e a utopia de um mundo futuro
onde a figura feminina é a mais poderosa entre os sujeitos e
onde um rei branco pode ficar à mercê de um peão negro.
Ou seja, há séculos prediz e ensina o caminho das pedras e dos rios.
Lascivo, potente, entranha nas mentes seu vigor,
asperge magia que transforma.
No âmago do prazer que consuma, no amargo que sofre, estão suas plumas
onduladas de mistérios, marcando a fogo o coração de aço que precisa,
para não desfalecer.
Grande mestre da arte que ensina, ilumina a trilha na escuridão da mata
fechada em que tudo é possível, nada é incólume, e desistir é o atalho
para as feras o engolir.
A distância igual que separa derrota de vitória, determina a marcha da
vida em sua grandeza ou desarmonia, e ele vigia em silêncio.
Xadrez é preto no branco sem escalas, impassível, glorifica a justiça
plena na solidão do fracasso, no júbilo da conquista.
Alerta do perigo invisível na esquina, leveza no pé que toca o solo minado,
olhar atento ao que não vê, cuidar da colheita antes do anoitecer.
Um enorme ponto de luz evolui no imenso saber que inclui a densidade coletiva
necessária, a exata união que agrega, a organização que insiste,
a cooperação que carrega, a igualdade que existe, com elementos tão
desiguais.
Nessa fonte inesgotável de amor e pressa, o tempo não passa, apenas os
minutos a morderem a carne das horas com seus dentes afiados.
O xadrez nos leva ao paraíso e seu inverso, só os versos dessa
poesia nos guiam aonde vicejar.
Ao fim da lida, todos se deitam para um sono igual,
sem sonhos sem nada, agora descansam na partida final.