Querido desespero
Desespero, querido desespero,
o que é essa sensação que rasga a minha pele?
Que parece querer me partir de dentro para fora a todo segundo; que multiplica o peso de todo o meu corpo por cem, e o dos meus pensamentos por mil; que parece se agitar toda vez que reina o silêncio, toda vez que me fita o espelho, toda vez que estamos a sós você e eu.
Querido desespero,
é tão doloroso esse mar de incertezas; essa montanha de questionamentos temerosos que escurece cada vez mais; que me ameaça com os olhos, imóvel no canto do quarto, enquanto eu tremo para ficar de pé; que cresce de tamanho toda vez que você me pergunta o que fazer quanto a ela.
Querido desespero,
o que eu faço para poder descansar?
O "só mais um pouco",
virou muito
há muitos anos;
o "um dia de cada vez",
me apavora ao fim de cada noite;
não quero " apenas continuar caminhando",
não quero "esperar passar o momento",
eu só quero descansar.
Querido desespero,
por que meu corpo me angustia?
por que minha voz custa sair?
por que eu não posso usar aquela cor que combina com a gente?
ela realmente combina tanto assim?
ela me faria mais eu ou menos eu?
Querido desespero,
me entregue sua sinceridade, mesmo que seja em contradição;
afinal de contas, o que sou eu?
Querido desespero,
sempre valorizei despedidas;
sempre temi a necessidade de uma;
todos os dias anseio em me despedir de você;
talvez mesmo agora, aos pedaços,
eu já esteja à porta, de malas prontas,
com a boca amarga pronta para dizer:
- Estou de partida.