TRINTA ANOS OU MAIS

Ele ainda a esperava

todas as tardes às 17 horas

na mesma pequena livraria

que já não existia mais

Em meio a livros imaginários

decifrava trovas de amor

no caçar dos versos perfeitos

que nenhum Dante

Camões ou Shakespeare

jamais poderia ter feito

Leria quantidade maior de escritos e papiros

que sequer a Biblioteca de Alexandria possuía

Percorreria os imensos corredores dos anos

que nem o próprio Matusalém conseguiu

Sobreviveria a imortalidade

mais que a soma de todos os deuses

que os milênios outrora soterraram

E ainda assim a esperaria

todas as tardes às 17 horas

na mesma pequena livraria

que já não existia mais

Sentado no canto invisível

daquele lugar que o mundo esqueceu

aguardava o chegar inevitável da noite

folheando recentes obituários

no encontrar dos nomes familiares

Os ossos da eternidade já pesavam

em seus ombros levemente arqueados

enquanto presenciava sempre

o extinguir das tardes mortas

no cerrar das luminosidades escassas

pelo despertar insone dos postes

E quando chegada as noites

voltava derrotado às camas

com a confiança dos devotos

de que amanhã ainda a esperaria

pelos próximos trinta anos

ou mais

Joaquim Cesário de Mello
Enviado por Joaquim Cesário de Mello em 14/04/2022
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