sentimos pressa...

De repente...

ouço que minha ânsia não está sozinha.

Parece-me soar a pressa dum sentimento atemporal,

reverberada ali, na parede caiada.

Em mim, então,

a poesia dobra sob a sonoplastia dum relógio que pia assustado

e que me parece ter pressa,

assim como eu.

E juntos nos reverberamos ao mundo.

O Cuco soa..."olá!"

Eu lhe sorrio e ouço, com clareza, que já não é mais o mesmo.

Mudou de timbre.

Levei-o ao relojoeiro que cismou...cismou...

e diagnosticou: "é o tempo".

Engrenagem empoeirada...

Espraiadas as tantas poeiras, voltou só melhorado.

Seu mecanismo

ainda me soa a gemência das badaladas que teme.

Soa como se se arrastasse num tempo minado.

Eu já sabia:

que não há remédio eficaz para o cansaço das obrigações...

Às vezes, ele emperra justamente nas horas plenas...

como se morresse na praia do próprio tempo cantado...

e consumado.

Começa bem...mas perde a sonoplastia da essência

a me soar o grito dum tempo anacrônico.

Confunde as horas...como numa apraxia de vida a esmo temporal.

Insistentemente

Como um "coach" que sobrevive sem noção do meio,

eu insisto (como se num auto domínio) e lhe cochicho:

"vamos meu cuco, é chegada a hora, dobre-se ao tempo!"

-Dobre-se nobremente ao tempo...

é só mais um comando de corda, dentre tantas e tantos...

e quantos deles...

E ele se esforça para tentar -eu o sinto- concordar comigo.

Então me obedece ainda que enrouquecido.

Como ele, também anseio por todas

as pressas da existência consolidada.

E quando soamos inexatos, ambos tapamos nossos ouvidos.

Só para suavizar as engrenagens pulsantes dos nossos corações .

Como é difícil soar os mísseis da finitude dos tempos...

Como por milagre, sem esperar,

Já ouço as suas horas plenas

e , então, sinto mais pressa ainda.

Uma pressa -como a dele!- ressuscitada.

Sinto pressa de tocar a flor no germe do seu enredo.

Só mais uma vez.

Delicadamente, sem nada mais lhe pedir.

E soar o feito ao mundo...

Porque não há o que se pedir à eflorescência do tudo que brota limpo, ingênuo e belo.

A mim, hoje me basta toda a força que sinto me dobrar invisivelmente.

São bastantes os toques aconchegantes de toda textura brotada

que logo mais se esvanecerá de ter sido...

Mas que plena e genuinamente foi.

No êxtase de livre ser... sem se curvar ao seu tempo previsto,

cronometrado sem a piedade dos debochados e perdidos segundos.

Basta-me o agora...verso de efeito que me soa como boa vingança.

A dobrar...

No sorver de todo perfume emanado dos mistérios

do nunca se saber nada sobre o tudo que corre sem domínios...

Sinto pressa duma plenitude que não sei poetar...só sei sentir.

Algo sempre a soar minha pressa que não está sozinha.

O cuco já dobra forte e grita: poesia é elixir às vidas.

Seguimos, então, no soar da nossa conjunta catarse apressada de sempre existir.

Pressa, muita pressa de se ser só verso plenamente versado

à ilusão real, tão urgente e boba

de -ao menos!- acreditar que podemos tentar ser...sem pressa.

Quem sabe ainda nos haja tempo.