A água que lava teu corpo tem sorte.
Escrevo porque não sei de ti e isso me enlouquece ao ponto de desejar que tu não existas. Não é como desejar-te a morte, porque para morrer é preciso existir. Desejo que não houvesses pisado por aqui.
Escrevo já sabendo que minhas palavras farão volta antes mesmo do teu retorno. O correio as devolverá por endereço não encontrado. E quando para mim regressarem em súplica, eu as lerei fingindo estranhamento para não deixar que caiam em esquecimento.
A água que lava teu corpo tem sorte. E isso me enlouquece ao ponto de desejar que permaneças imundo. Que a poeira dos caminhos por onde andas se encrave nas entranhas da tua pele marcada, nos buracos e na sombra. Que estradas percorre um homem cuja lembrança enlouquece uma mulher como eu?
Escrevo porque não sei de mim. Tu me carregas nas pontas dos dedos que se enrolaram em meus cabelos embaraçados. Um fio. Mil fios. Matéria morta que se mistura à sua, e isso me enlouquece ao ponto de desejar não ter paradeiro. Quero me mudar em janeiro, e novamente em fevereiro, e estar à mercê da tua lonjura.
Escrevo porque aprendi que a sina de um escritor é
coração, desejo e dor.
E minhas armas para lutar, resistir - e me acabar - são
palavra, descaramento e amor.
@literuaitura