...CONTINUO LÁ
Não é pelas ruas da infância que ainda percorro
mas no atravessar do canto dos pardais
e no pisar das calçadas amareladas de oitis
Passeio pelos mesmos cantos e buracos novos
como se pedalando bicicletas e me desviando
das raízes das árvores que menino contornava
As casas de antes continuam sendo paisagens
resistindo ao mudar do mundo e dos transeuntes
embora nelas morem estranhos residentes
indiferentes aos fantasmas das famílias de ontem
que me povoam os espaços mais salgados da memória
Por aqui andei
como agora ando por sobre as pegadas apagadas
daquele miúdo garoto que então não sabia
que além das fronteiras daquela quadra
havia territórios a serem ocupados
e cemitérios que até lá nunca foram visitados
Não preciso das madeleines para de mim ser lembrado
já vivo em meu próprio sítio arqueológico de ossos
e nos dias de chuva ou de frio me dói a costela retirada
Ao contrário de Bandeira meu Recife não está morto
e a casa da minha avó continua infiltrada de eternidade
Pelas ruas da infância que ainda percorro
sopram-me aos ouvidos remanescentes de sonhos
que são para mim sobras da minha anterior imortalidade