Segunda morte
Na poeira do tempo me perdi
Dores profundas causei
Outras tantas causaram-nas em mim
Como uma fera solta no pasto eu me sentia
E fazia com que todos sentissem o estrago que eu causava
Mutilei, feri, dilacerei,trucidei,
E sem dó ou piedade eu matei
Sangrava a todos que meus caminhos cruzavam
Desci às profundezas abissais
Demônios me perseguiam e eu corria pelo pantano fétido
Cheio de feras como eu
Não sabia se sonhava, nem se vivia ou se morria
Somente aquele ódio causticante a me corroer
Era como se engolisse brasas, lavas vulcânicas que saíam das profundezas nauseabundas
Um dia o remorso chegou
Alcançou-me no meu tormentoso caminho
No meu Cáucaso...
Aquela dor que o remorso traz é a pior de todas...
Sempre vem depois do ato consumado e amarga, fere, trucida, queima...
É a segunda morte
A morte depois da morte
A morte que morre quando já se está morta
Que enlouquece, atormenta e embrutece
Gritei por mil séculos
Com aquele espinho a perfurar meu coração ferido
Ninguém ouvia....apenas minha voz e orava me deixando mais confusa
E eu sangrava
Corria desesperada
Tudo em vão, o remorso não me deixava em paz
Na minha mente só ouvia as vozes dos inocentes que eu aliciei e muito torturei
Onde está o meu mundo?
Em que lugar deixei minha Terra?
Em que inferno estou?
Nesta segunda morte não me vejo como humana
Meu olhar baço e perdido
Quase um réptil
Verdugos me chicoteiam
Ah, que gritos infernais, eles não me deixam em paz
Meus mortos estão vivos e eu morta-viva estou
Estou sendo vingada, julgada, sadicamente torturada num festim diabólico
Vertigem infernal
A dor atravessa minha alma
O frio me castiga
A fome me atormenta
Corro feito louca, sinto meus cascos arranhando o chão
Mas que chão se eu não mais tenho chão?
Que pesadelo surreal, diabólico!
Nem Mefistófeles é tão cruel!
Sou um farrapo humano
Perdida no abismo infernal
Julgada e condenada diariamente por todos os demônios
Já morro pela segunda vez
Talvez me desintegre
Já sou verme disforme
Atormentada rastejo na lama podre dessa treva sem fim...
Meu crepúsculo... É um fim com terror de quem um dia praticou o terror sem fim...