Benditos Malditos (Joaquín Sabina)
Benditas sejam as raras exceções
As contusões dos vulneráveis
Os lábios que aproveitam os rincões
Mais esquecidos, mais inesquecíveis
Abençoados sejam, abençoados sejam
Os santos milagrosos, os gordos carinhosos
Os loucos que pensam que são Napoleões
As pálidas lesbianas, os doces “maricões”
O ranho de gente com ventana
As pessoas de um olho que não querem ter visões
Os mortos que morrem com desejo
Abençoados são os zeros à esquerda
Aqueles que não nasceram em lugar nenhum
Os de “Viva Zapata” devem perder
As damas que se chamam solidão
O sabre do sabrista, as cáries do dentista
O Buenos Aires, os maus maridos
As drogas veniais, a sopa do cozido
Os inteligentes que parecem subnormais
Aqueles que poderiam ter sido e não têm querido
os descendentes dos animais
Maldito seja o justo, o submisso
Os que tiram pênalti de cabeça
Os que antes de urinar pedem permissão
Os súditos do deus da certeza
Os que enfeitam as notas de seus filhos
Os cidadãos honestos, as crianças
Os que exploram com rede e a prazo fixo
Os canalhas que nunca quebraram um prato
Maldita seja a voz da experiência
Quem quase se equivoca na meia soma
O cachimbo da paz com a consciência
Os que ouvem “em meu táxi não se fuma”
Os que se molham pouco quando chove
Os que só sorriem nas fotografias
Os que progridem porque não se movem
Os que são da escandalosa maioria
Malditos sejam, malditos sejam
Benditas as loiras “calientes”
que se emocionam a cada momento
Os tímidos que ficam falantes
A mancha de mosca no beato
Benditos sejam, benditos sejam
As fadas com saliva, os galos das divas
Os calos nas pernas do coxo
As papoilas vermelhas, a avó em São Firmino
Os recordes que não aparecem no “guinness”
Os cínicos que choram nos cinemas
Os trevos de três ou quatro folhas
As enfermeiras que aumentam a febre
Os peitos com mamilos hospitaleiros
Os gatos que não dão porco por lebre
Os Mistérios Gozosos do Rosário
A namorada do toureiro, os brônquios do toureiro
Os tristes que riem da tristeza
O rico sem dinheiro, o preguiçoso com preguiça
Os últimos que chegam primeiro
Os calvos que tiram o chapéu
Ante a dignidade e a beleza
Malditos sejam os tontos com medalhas
Os filhos da mamãe, os informantes
Os candidatos (fechem a parede)
A letra pequenina do contrato
Os cafetões que sugam as pessoas
As diabetes, a AIDS, a velhice
Os sorvetes de bile que jorra
Os que aplaudem o príncipe do funcho
Os contos das contas que são contadas
As taxas de juros, as liquidações
Os que se aposentam aposentados
Os Talibãs do último grito
Os que nunca passam do ponto
Os que batem em simetria
Os que exibem celular na praia
Os que caguetam na polícia
Malditos sejam, malditos sejam
Joaquín Sabina
Tradução: Aberio Christe