O que me flutua

Não é assim tão tarde.

As roseiras já confabulam,

os espinhos esperam o alarde,

e as gotas de orvalho murmuram.

Não é tanto pela sombra

que na orelha ostento um só brinco.

"Por que uma?"

Respondo a seguir: "Aguarde".

Não me vejo em duplas distintas

Sou o meio do lado esquerdo

e o avesso do dente canino.

Pulsando, trituro e engulo.

No lado direito sou honra

assumo, assino, cumpro.

Centrando, aqueço desejo

acolho, desfaço, concluo.

Horizontalmente sou vertical

não me permito nódoa mental

saio à luta, carrego bandeiras

ensabôo, lavo, enxugo.

Ouço sons paralelos à noite

danço-os em suaves baladas

enluaro o céu de minha boca

transpiro só madrugada.

"Por que só uma?"

Porque uma e tão somente uma

é a face que me modela.

Nessa imagem do espelho

que reflete a minha íris

leio minha própria pauta.

No rascunho da minha vida

rabisco minha própria arte.