MINHA ALDEIA NÃO MORA MAIS AQUI

Há sempre uma casa sendo derrubada

e um prédio novo em construção

Andaimes de aço e tapumes

abocanham como bocas famintas

as paisagens imorredouras do passado

em que antes tateava o menino

até onde morava Lucinha

lá vizinha da quitanda

na qual crianças de agora

brincam ruidosas nos playgrounds

e crescem molhadas nas piscinas

Não restam mais chãos baldios

nem campinhos de terra batida

em meio aos arvoredos

em que de dia se jogava futebol

e de noite se namorava em silêncio

ao som dos grilos e das cigarras

embaixo do brilho cúmplice das estrelas

Farmácias igrejas e faculdades

são hoje monumentos fúnebres

onde se acham sepultados

os destroços e os fantasmas

de toda minha recuada infância

Quando morrer vou viver

sob os alicerces dos edifícios

Joaquim Cesário de Mello
Enviado por Joaquim Cesário de Mello em 03/02/2022
Reeditado em 03/02/2022
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