Quando eu morrer,

Quando eu morrer,

serei por Deus levado

para longe, a um lugar perfeito e meu.

Não serei, em tais terras, um plebeu,

porém dono de tudo, e valorado.

Quando eu morrer,

meu deus terá me amado

tanto que me fará, como um presente,

um lugar nem tão frio e nem tão quente,

e dirá que é possível ser feliz,

para sempre feliz, em meu país.

E eu não me caberei de tão contente.

Quando eu morrer,

então de olhos fechados,

após o último choro de meu filho,

após o último adeus de meu amigo,

após serem meus bens compartilhados,

Deus e eu, pelo cosmo arrebatados,

iremos conhecer a perfeição.

Abrirei o sorriso mais cristão

de toda a minha vida de pecado.

E, ao surgir minha esposa do meu lado,

eu abrirei meu sorriso mais varão.

"Como pode este mundo ser perfeito

"se em vida fui tão sujo como um bicho?

"Não tem Deus em punir-me seu capricho?"

Então me ajoelharei de humano jeito,

e Deus se orgulhará de ter me feito.

Minha esposa, sorrindo, a mesma mão

com que pequei e fiz-me de vilão,

apanhará com cândida ternura

feminil, e minha alma será pura.

Não terei de aprender outra lição.

Mostre-me aonde ir — eu pediria,

e ela, pelas terras de algodão,

por bolos e sorvetes de paixão,

por livros e por filmes de alegria,

por tudo o que no Céu sei que haveria,

me levaria, rindo, pela mão.

Mostre-me aonde ir — e eu, loução,

alegre como a brisa, lhe diria

que tudo por ali era alegria,

que Deus era bondoso e brincalhão.

E, se um dia ficássemos cansados,

Deus faria a magia angelical,

e tudo se voltava magistral,

pois do tédio nós fomos expurgados.

Não há sono, fome ou machucados;

nada assusta, pois tudo é matinal.

Não há fraqueza, azar ou hospital;

nada cansa, pois tudo é repetível.

Quando eu morrer, direi o indizível,

e tudo o que sofri será banal.

17/01/2022

Malveira Cruz
Enviado por Malveira Cruz em 17/01/2022
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