Inventário
Na solidão do quarto
Torno a parir um novo aborto
No bloco de notas...
Que depois vai para o blog
Que depois vai para as mentes
E, em algumas, vira semente
De novas ideias.
Penso em ti
Penso em ti como és agora
No meu congelado coração.
Perdi absolutamente a impressão
Do primeiro momento
Nem sei por onde
Perdi o bonde
Perdi a distância entre o primeiro riso
E a primeira critica ácida
Não somos Cuba
Mas sofremos inúmeros bloqueios
Nessa ilha de mares digitais
Vens e vais
A dor foi ficando mais sentida de um lado
O amor cada vez menos sentido do outro
De qualquer modo, um não soltava o outro
Não importava a gravidade da lua
Ou o cheiro da maresia
Até que chegou o dia
Deles finalmente se verem
Mas como não podia deixar de ser
Tinha que dar tudo errado:
Ele muito nervoso
Desajeitado
Tremendo
Ela necropsista
Dissecou sua desgraça
Diante do seu corpo...
E, num cruel preciosismo,
Mais de uma vez
Riu do seu nervosismo...
Encerrou a situação
Pegando o trem
E deixando o coitado
Sozinho na estação...
Bom, vamos desfrutar da emoção
De ser um escroto
Que acabou parando
Numa música da Adriana Calcanhoto...
E voltaram... por mais um dia!
Só para terem uma morte vazia
Tudo afinal terminando
Com ela enfatizando
O fato dele ser um fraco
Dependente
Deprimente
Apenas mais um demente
Homem nenhum!
Que filho ela já tinha
E não queria mais um...
Me pus a pensar
Então por que voltar?
Não dá pra explicar.
Desse inventário de um amor morto
Desse jeito de gostar torto
Nada vai ficar.
A única herança
É acabar com a esperança mesquinha
De ter-se um algo que não se tinha.
Salvo esse punhado de palavras.
Não estou a salvo.
Mais uma vez estou só
Só de alguém que eu pensava
Que me completava
Mas que, no fim das contas
Me era completamente estranha.