saudade, vó

teu coração boiando

na memória, tuas mãos

calejadas, onde o tempo

pousou e fez morada, me

tocando a testa nua, teu

café, teu almoço, a toalha

limpa na mesa da sala, alimento

em que o tempero despertava estrelas

no corpo, que era amor

exposto no prato de porcelana,

Onde ponho essa

dor, meu amor, onde vou

sem tua presença, teu

sim infinito, tua gratidão

desmedida, tua inspirada

forma de saber do campo,

me sinto assim, desamparado,

porque sei que partiu, onde

vou passear ou segurar tua

mão pra descer as escadas,

ou pra dizer o mínimo que

tua alma precisava pra se

sentir acolhida, cada

dia é um tropeço, um vão

a atravessar, seria um

jardim pra colher flores,

o banco pra tu sentares

uma rede pra tu balançar,

no entanto, sou saudade,

sou um naco de tua partida,

a única música que sabia

cantar, a preocupação de

que os nossos tenham duas

pernas e pés que os sustentem

no chão, o pão diário de

um delírio alegre, pensando bem,

fico ainda mais com tua

partida, pois as pedras

quando me veem emitem

tua voz, as árvores agora

me dão bom dia e as momoneiras

deram pra sorrir pra mim

e se tivesse braços me amarraria

para que a vida fosse

mais segura, mais sol

e alegria, de você,

não perdi nada, talvez

aqueles dias de passeio,

onde a novidade das coisas

na sua simplicidade se acendiam

para nossa caminhada, quis

música, te demos, quis

rapidez, o cosmo cumpriu,

que sorte! me disse uma

vez sobre aqueles em que

salto seja instantaneo, eu

ri e te compreendi, pois

agora sei, que os minutos

tem neles sua própria miséria,

seu tedio de manivela, e que

a vida nada serve sem

sua parte primavera, e nada

é o que é, salvo enquanto nossos

olhos nos enganam, andava

entre os carros, que medo

que alguns deles falasse

mais alto que tua sorte,

e tantas teve e tantas eu

tive em me saber teu, em

me saber mais tua morada

que a minha, onde ponho

essa saudade, essa solidão

que estão nas paredes desde

quarto quanto na medula dos

meus ossos, mas me alivia

saber, que do teu jeito foi feliz,

e que sabia vencedora dessa

vida simplesmente porque amou,

porque se deu, porque debaixo

da tempestade mais tenebrosa,

não correu, abraçou os teus

como se sem eles, o mundo

não fosse nada mais

que uma covardia, uma

infâmia, um lago vazio, um

deserto, que venceu esse

claustro que alguns chamam

de vida porque como ela, soube

preservar teu mistério, tua

graça e sua imensa capacidade

de viver sabendo que também

era morte, que é chegada, mas

também era partida, que é fruto

mas também a terra que tudo

devora, que é o outro tanto quanto

a si mesma, de nutrir, que se

realizava mais se dando que

recebendo, de nos fazer herdeiros

de frases tão desconcertantes,

que com o tempo seriam leis,

códigos, jeito de ser e de viver,

amou e foi amada, e ainda que

longe, é mais imensa que essa

dor, que se pensar bem, é uma

honra, pois ela é só o reverso

da beleza que nos deu.