Fruto Proibido pt. III
Acho que morri noite passada; ela sumiu, não é mais real.
E a esquecer é o nascimento da tragédia, e de todos os medos
A lenta tortura, que some com a lembrança do olhar vestal...
Mesmo assim é possível a sentir, no fundo de meus segredos.
Eu não mereço lembrar nem mesmo os fragmentos da lembrança?
Tamanha beleza em queda nos abismos obscuros da memória...
Noites frias e chuvosas completam tal ausência da bonança
E escorrem como lágrimas pelo falso espelho da oratória.
Por que o Sol se despede timidamente quando chega o inverno?
As memórias passadas podem e devem nos ver no presente.
Muda estação, muda uma letra, o paradoxo e o mesmo inferno.
A profunda distância faz do amor à luz de Vênus ausente.
Mas me mantenho no que posso, e na saudade pensando.
O sorriso em a ver e o pranto frio ao tentar recordar.
Minha existência úmida pela esperança ainda vai esperando,
Porque eu a amo! Mas nem mesmo sei como deveria a amar...
Penso e sinto o seu olhar... Criado para tão somente sorrir.
O olhar cetáceo, misterioso e que põe à prova o divino.
Como duas estrelas, e solitárias, na vastidão do porvir.
Dos cantos possíveis eu a encontrei justamente no destino.
Os cabelos que a noite encanta e imóveis ao injusto vento
Lembram os milagres do mar vermelho e derradeira cena.
E no momento em que eu decidi descer ao meu esquecimento,
Além do vazio, além do nada, surge ela e sua imagem serena.
A realidade isenta! O que era real e real é o que agora?
O grande desengano, o fruto proibido era Eva em si!
Porque ela é a primeira, e como tal a minha última aurora.
Por sua lembrança abandono toda poesia que ainda não escrevi.