NOITE
As lágrimas brotaram
do rosto daquele pai.
Ainda existia choro em seus olhos
recorrentemente chorosos.
Sentia-se impotente, e tal sensação
tomou-lhe todo o corpo até aos ossos.
Um pensamento lhe veio tão dolorosamente questionador:
o que vamos comer?
Neste instante olhou, então,
para o único quarto da pequena casa.
Dormiam sua esposa
com a pequena caçula,
numa cama improvisada ao chão.
Duas redes embalavam o sono
dos filhos mais velhos
um com seus nove anos, o outro
quase moço feito.
Todos dormiam em paz, menos ele,
o pai.
O pai se sentiu aliviado
porque dormiam
e não compactuavam com a sua
angústia.
Postergavam a dor de não ter
o que comer
enquanto ele, com a alma tão maltratada
pela desesperança,
sonhava ter a dignidade respeitada.
Virou-se, então,
para a noite de lua e estrelas
que entravam pela janela
e, como criança,
quis sonhar.
(In. Epifania)