O resgate dos inocentes

In extremis, direito a nada.

Estás entre feras,

como estivera ao luar,

em seu berço de relva,

o curumim kamayurá.

Supino na ara de pedras.

Nada sabes. Só esperas

– de olhos rútilos e atentos... –

o acercar da mãe-da-lua...

Na selva bruta ao relento.

Nascemos iguais (sim!).

Na indigência nascemos

e em lastimável desamparo,

suplicantes da clemência

de algum nômade ignaro.

Pisamos lugares altos,

rés ao bafo de Moloch,

num frenesi prazenteiro –

ali fartamos seu ventre

de vítimas sem defeito.

E quando nos vimos sós,

sem norte, com sol a pino

sobre o crânio descoberto,

ergueu-se um brado sombrio

no torvelinho do deserto...

“Filho do homem...”

(assim disse o Pregador)

“Não estás avisado do que se passou?

Não sabes –

Aqui viemos ver o terror.”

Recorda então! O raio súbito(!)

as trevas entrecortando

em voo vertiginoso!...

E o bálsamo perfumando

o anoitecer vaporoso...

Recorda, tolo! O mergulho(!)

do defensor no desate

da cutilada certeira.

E o refrigério infinito

na rósea luz da fogueira.

A morte era já disparada...

“Abraão! Abraão!”

– Diz a mão que irá detê-la... –

E a noite escura em Moriá

brilhou crivada de estrelas.