sou poeta

no seio luminoso

a caverna se expoe,

sombras sob lunetas

das misérias do tempo

encobre o rosto dos adormecidos

pergunto, nada responde, só

o silêncio a rondar o misterioso

gosto de trevas, os caroços de medo,

as asas negras da vista que já se apagou.

caminho silenciosamente, aqui ninguém

fala minha língua, mas reconhece

minha presença, eu os espreito

sem saber seus nomes e o tamanho

de suas estatuetas,, suas formas

e os devaneios que lhes adorna os chifres.

sinto cavalos sem crinas, mulheres sem

vulvas a preencher os potes onde

o tempo escorre e ninguém podem detê-lo,

não há consolo, somente a semente dura

que nem água ou martelo descobre seu segredo,

falo comigo, com quem mais? não respondo,

mas apresso os passos na esperança de

uma lamparina acesa. Minhas pernas

doem, adiante uma floresta escura,

olhos no escuro faz perguntas, mas

só causa medo, não sei o que dizer,

me aprofundo nas trevas das dúvidas,

nem um livro pra ler, um poema pra

aquecer, ou abraço que me devolva

a delícia de uma lençol bem lavado,

atrás das escarpas, um rio que

desabrocha de uma pedra feita de

madeira, já não arrisco meu destino,

sou homem, já não preciso nadar,

boiar sobre a lâmina afiada da

superfície das águas, sou e deixo

ser, e não me interessa o que seja

porque nesse devaneio os pensamentos

são ventanias, são armadilhas que

não se escapa, me deixo prender,

afundar, ser, e a linguagem vai

me dizendo meu destino.