pedagogia das flores
aprendo com a resistência das flores
que a ousadia de nascer e renascer
a cada dia e em cada instante
por diversos cantos do mundo
que um outro mundo
é possível de composição
sem a imposição da força
sem a aridez da volúpia das horas
mas com a ternura das mãos esculpindo poesia
com o louvor do dia a dia
aprendo com as flores
que um outro mundo melhor é possível
sem ganancia e sem o torpor consistente dos lucros em demasia
aprendo com as flores a fruir da beleza de cada dia
sem ter Deus como culpado dos farrapos e dos farrapados,
dos famintos e sedentos por comida
anêmicos sem boniteza
sem enxergar o vapor das coisas que lhe consomem
cada mulher e cada homem
não só fome de comida: feijão, farinha, teto e chão
mas a tão abnegada fome de beleza,
de boniteza
de flores alastradas mundo a fora
a embelezar com gratuidade
sem demora de existir
fome e sede do calor dos olhares infinitos da beleza de muita gente
enrugada por entre as pálpebras do tempo
gente escondida e dirigida pelo tenaz medo de viver
a essa gente encurvada perante a teimosia dos que fabricam fome e sede de comida palpável e invisível
aprendo com as flores
dia a dia
a gratidão de na solidão vivida
crescer perfumando sem cobrança e sem incômodos pragmáticos
aprendo com as flores - sempre
a comungar cada raio de sol com outras flores em sintonia
mesmo ausentes ou presentes
a clarear a imensidão da labuta de cada dia,
de cidadãos sem cidadania, escravos sem alforria
a peregrinar caminhos salobros, íngremes e torpes
iluminados por todas as flores em cores e cheiros
aprendo sempre com as flores - sempre !