CANSEI !

cansei de fingir ser forte

de erguer tochas de fogo ardente

com minhas mãos calejadas se diluindo com tanta dor

e ainda esconder dentro de mim sua ardência e meu pavor

sua frequência e seu queimor

que tanto me fizeram chorar às escondidas

por entre as cortinas da vergonha que até hoje me intimidam

eu tinha por medo uma estima imposta por outros homens objetos coisificados massificados a serviçais do sistema

cansei de fingir ser forte

escondendo lágrimas com gostos de sangue

escondendo lágrimas com cheiros de sangue

como se lágrimas não fossem coisas de homens

e lágrimas tão sinceras foram escondidas por entre festas de máscaras de mentiras

e eu prostrado e escondido sob o rigor do altar mor de sacrifícios moribundos

me devastando a alma,

me corroendo a alma

me subtraindo como ser humano, como gente, como homem

CANSEI !

me cansei de me fingir forte

de maquiar a minha vontade de chorar

de permanecer com choros cerrados e amarrados por entre meus dentes

derivando outros desníveis de sorrisos postiços

nada férteis para o meu mundo subjugado pela covardia dos que nunca foram e nunca serão - homens de verdade:

desses tolos que respiram pelo pulsar da morada da alma

cansei de me fingir forte

de me torturar em troca da aprovação ridícula dos que nada sabem e nada vivem ou viveram

apenas sobrevivem no rigor das velhas batutas enferrujadas

dos velhos nortes empoeirados

de caminhos pré - fabricados e caiados de hipocrisias

CANSEI!

CANSEI!

CANSEI!

cansei de consolar lágrimas quentes

de fazê-las escorrer friamente garganta a dentro

como gotas de fogo derretendo,

como larvas de vulcão a escorregar invertidas pra dentro de mim

a arder e escurecer as minhas vistas

ferindo, correndo e silenciando minha dor

espatifando meus alicerces em meus terrenos interiores

lágrimas e sorrisos como disfarces postiços

- era a mais pura verdade

entre sorrisos e lágrimas tracei caminhos longínquos

fincados sobre pedregulhos e armadilhas

sentia fome e sede de ser gente

como uma serpente que deseja comida

lagrimas cravadas e soterradas pelo equívoco de ser macho

lágrimas contidas como se contém o furor de um vulcão

a arder e queimar por dentro a causar feridas na minha alma

alma ferida chora e grita impregnando silêncios que se evaporam

por entre a invisibilidade dos instantes que tanto ardiam

cansei de fingir ser forte

desistindo de mim mesmo

em troca de aplausos hipócritas de uma sociedade prostituta

que amputa a si mesma em nome de um verniz social

que acolhe com hipocrisia

CANSEI!

cansei de me vestir de esconderijos

CANSEI! CANSEI! CANSEI!

cansei de me soterrar em maquiagens bolorentas e bizarras

agradáveis a todos - menos a mim mesmo

eu era um solitário na platéia alheia

cansei de ser prostíbulos dos meus sentimentos

cansei de ser postiço, armado,

maquinário exclusivo de sorriso falsos

cansei de ter minha alma esticada num varal perante

o abismo, do silencio covarde que sempre me rodeava

CANSEI!

cansei de ser ridículo!

palhaço de mim mesmo,

apito surdo e mudo de minha escolhas

pisando em palco falso

em escadaria de ventania sem destinos

cansei de ser fantoche

em guilhotinas ásperas

tempos perdidos com volumes de minha tortura

que sempre fingir ser eu um forte

sem o domínio das rédeas que me encurtaram caminhos

rédeas que me amputaram sonhos

por isso CANSEI!

quanto tempo perdido pela tortura

de me fingir forte

sem ter o domínio da miopia que só me encurtaram caminhos

cansei do brilho do seu olhar oco, sem viço, sem sonho, sem a alegria de ser o que realmente são das certezas tristes do que nunca vão ser

pois o seu medo se torna absoluto e confortável na sua dureza de ser

um encaixotado apenas

que se explodam as caixas com seus encaixotados de plantão

escravos e fantasmas em delírio coletivo

eu quero as minhas asas pra sonhar e compor orações rabiscadas aos ventos tênues que me fortalecem em ser verdadeiramente quem sou

sem ser a fuligem infértil de suas opiniões vadias

quero me vestir com a minha própria nudez sem me esconder de mim mesmo

prostituto do meu ser inacabado, imperfeito alimentado pela ousadia de de poder dizer que estou cansado

e das cinzas desse meu cansaço sei que surgirão flores com cheiros e cores e com perfumes com a cara de Deus-esse testemunho maior dos meus destinos

e vou incomodar com meu sorriso novo, largo

e nunca mais ser preso dos seus caprichos e rancores destilados com seu olhar sobre mim

ser mutante, sonhador

mas nunca mais farrapo do seu dogmas silenciadores

camuflados que não resistirão à orgia de sr quem eu sou - homem pássaro que voa poe entre as frestas das incertezas onde surgem as bonitezas das utopias urgentes de serem vivenciadas em comunhão

cansei de fingir gozos, de forçar sorrisos, de escancarar o que eu não era

escondido diante dos maltrapilhos de grife que teimam em continuar extirpados e extirpando a coragem alheia

que se desdobra em ousadia

que se metamorfoseia no direito sagrado de sonhar

de fazer da utopia um terreno de andarilhos

verbos conjugados com as

cores das asas do verbo esperançar

porque um outro mundo é possível

meu ar vem do pulsar dessa força

impregnada em mim

!

Raimundo Carvalho
Enviado por Raimundo Carvalho em 09/06/2021
Reeditado em 10/06/2021
Código do texto: T7274902
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