SE A GENTE PUDESSE...
Se a gente pudesse ser franco
com todo o sentimento do olhar
Que sangra a alma.
Apontar toda a falsidade escondida
Nas terras esculpidas por dores explícitas
e subliminares.
Ah, se a gente pudesse...
Apontar toda a hipocrisia da mão fingida
que cobra ingresso na porta das tragédias
das todas e tantas!
Só para vendê-las ao amanhã
à entrada da audiência morta do dia...
Sob o tudo que também
implora por uma notícia à disposição das tramas.
Se a gente pudesse contar
de todas as horas contadas em vão
Passadas e perpassadas em branco
Surdas aos gritos por socorro.
E contar e recontar dos tempos repetidos
Que sobrevivem de todas as mesmas necessidades
Nunca apaziguadas...
Falar das mãos
que se estendem sob holofotes dos eus narcísicos.
Se a gente pudesse cartografar nas ruinas
todas as bondades da atual indústria lucrativa nos destroços.
Como um ferro -velho milionário...
que sobrevive das carcaças do tudo.
Se a gente pudesse
sem censura alguma da nossa emergência que sua,
Intubar todo o sentimento asfixiado
e depois exalar todas as mentiras
acumuladas como verdades
nos alvéolos interrompidos duma terra que morre.
Se a gente pudesse ao menos ser um auto da verdade
Num palco não maquiado pelos contrarregras.
Comprar o ingresso (não o dos tantos cambistas das dores!)
ao último ato
do espetáculo do final dum tempo
dos tantos coliseus dos Homens versus Homens.
E depois...
seguir por aí...livre das horas mentirosas
que acreditam poder enganar toda a poesia
engasgada nas gargantas.
Se a gente pudesse...dizer do todo (e ao todo!)
Sobre o tudo que a gente não pode um dia,
mas lá no epílogo dos horrores, enfim...
poder sentir o prazer numa ínfima linha do poema ,
o de já se poder ser, sem nenhum minuto de silêncio!
Um novo, uno e único verso gritante...
de liberdade genuína.
Ah, se a gente pudesse...