COM CARLOS DRUMMOND NO MEIO DO CAMINHO

TINHA UM POEMA NO MEIO DO CAMINHO

No meio do caminho tinha um poema

tinha um poema no meio do caminho

tinha um poema

no meio do caminho tinha um poema.

Nunca me esquecerei desse alumbramento

que impactou minha vida profundamente.

Nunca me esquecerei que no meio do caminho

tinha um poema

e que no meio do poema tinha um caminho.

TINHA UM CAMINHO NO MEIO DA PEDRA

Tinha um caminho no meio da pedra,

No meio da pedra tinha um caminho.

Tinha um caminho na fenda da pedra,

Um caminho estreito. Tinha um caminho.

Tinha um caminho na fenda da pedra,

Na fenda da pedra tinha um caminho,

Tinha um caminho incongruente à regra,

Incongruente à regra, tinha um caminho.

Caminho de esforço, de fé, esperança,

Caminho de paz, de perseverança,

De resiliência, de superação...

Tinha um caminho que a imagem não medra,

Tinha um caminho no meio da pedra,

No meio da pedra, tinha um caminho!

TINHA UM POEMA ESCRITO NO MURO

Tinha um poema escrito no muro,

Tinha um poema escrito no muro,

Tinha um poema escrito, eu juro!

Como uma estrela brilhando no escuro,

Como uma semente rompendo o chão duro,

Como uma esperança apontando o futuro,

Como um conselho para o imaturo,

Como uma seta pro caminho seguro,

Como um grito livrando de apuro.

Tinha um poema escrito no muro,

Tinha um poema escrito no muro,

Tinha um poema escrito... Eu juro!

TINHA UM RIO NO MEIO DO VALE

Tinha um rio no meio do vale

No meio do vale tinha um ri

Tinha um rio no meio do vale

No meio do vale tinha um rio

Tinha um rio...

Nunca me esquecerei desse acontecimento

Nas lembranças de minha infância

Que no meio do vale tinha um rio

Que tinha um rio no meio do vale

Tinha um rio...

Um rio de águas cristalinas

Um rio cheio de peixes...

Um rio que poluíram...

Um rio que assassinaram...

Tinha um rio na minha infância

Que hoje não encontrei...

Tinha um rio no meio do vale

Que nunca me esquecerei.

NO MEIO DA RUA TINHA UMA BALA PERDIDA

No meio da rua tinha uma bala perdida

Tinha uma bala perdida no meio da rua

Tinha uma bala

No meio da rua tinha uma bala perdida

Nunca me esquecerei desse momento de pânico

Que acabou com a vida de um ser inocente

Nunca me esquecerei que no meio da rua

Tinha uma bala

Tinha uma bala perdida no meio da rua

No meio da rua tinha uma bala perdida.

NO MEIO DO CAMINHO TINHA UMA PEDRA QUE DANÇA

“No meio do caminho tinha uma pedra”

Que me trouxe paz, trouxe-me esperança;

“Tinha uma pedra no meio do caminho”,

Tinha uma pedra, uma pedra que dança!

“No meio do caminho tinha uma pedra”

Que resgatou minha autoconfiança;

“Tinha uma pedra no meio do caminho”

Que renovou meus sonhos de criança.

Sim! Tem uma pedra na Paraíba

Que se fez suporte na minha vida

E que fez minh’alma ser mais humana...

Pedra que dança e que canta louvor,

Pois nela encontrei o mais puro amor,

Na bela cidade de Itabaiana!...

NO MEIO DO CAMINHO TINHA UMA FLOR

No meio do caminho tinha uma flor,

Tinha uma flor no meio do caminho.

Somente o poeta viu essa flor,

As outras pessoas só viram o espinho!

Somente o poeta pensou no amor

Quando viu a flor no meio do caminho;

As outras pessoas pensaram na dor

Que vinha da flor, por conta do espinho!

Somente o poeta esqueceu o queixume,

E com muita atenção, sentiu o perfume,

A essência mais pura de seu olor...

No meio do caminho não tinha só pedra,

Não tinha só pedra, no meio do caminho!...

— Na fenda da pedra... havia uma flor!

E AGORA, DRUMMOND?

Se você sorrisse,

Se você chorasse,

Se você tossisse,

Se você sonhasse!

Mas você está longe

Com o seu olhar distante,

Mas você esta duro

Como um quadro na parede!...

E agora José?

José que não vi,

José que não conheço,

José meu amigo

Que nunca me esqueço!...

Ah! se você chegasse

Nessa noite serena,

E cantasse uma valsa

Ou escrevesse um poema!

Mas você esta longe...

Você está longe, Drummond!

Não, você não ressuscitou!

Ao terceiro dia!

Nem mesmo prometeu

Que ressuscitaria.

E o que escreveste

Jamais pensaste

Ser eterna poesia!...

O poeta sério,

O poeta de vidro?

O poeta de ferro,

O poeta diamante

Das minas de Minas!...

E agora, Drummond,

Como morrer de novo?

Como não ser lembrado

Não ser bajulado,

Por todo esse povo?

TRÊS POEMAS DRUMMONDIANOS

I

Eu não tenho vergonha de dizer

Que gostaria de escrever

Como Carlos Drummond de Andrade.

Mas na realidade

Eu não me preocupo em escrever diferente;

Pois cada poeta escreve

Um pouco do que ele sente!...

Confesso até que tem algumas poesias

Do meu admirável poeta

Que eu não acho bonitas;

Mas o que importa

É que ele estava

Realmente, intrinsecamente,

“Preso à vida

E olhava os seus companheiros”.

II

Como a poesia perdeu-se tanto!

Como a poesia se faz tão fria;

Morta, morta, morta,

Na melancolia da tarde fria;

Na frieza desse fino dia...

Já não se toma a poesia

Como uma xícara de café quente;

Como um morno morno leite,

Do peito da própria vaca!

Agora tudo é diferente,

-empacotado, refinado, pasteurizado!

Não tem o sabor do fogo de lenha

Nem o cheiro do curral...

Cadê o telurismo?

O amor à terra natal?

Onde estão os poetas?!

(ouvindo música internacional!)

III

Parem a nave, parem a nave!

Pare pare pensamento

Que eu não vou escrever nenhum poema

Que não fale do meu tempo!...

Não, não irei voar,

Para Marte nem para Vênus;

Não irei somar demais

Nem irei multiplicar

Minha vida vezes menos!...

Não, não cantarei,

O tempo futuro!

Não serei de vanguarda,

Nem serei do monturo.

Quero apenas cantar

A cantiga do amor

Moderno e matuto.

Também não serei o poeta

De um tempo absoluto!

Quero apenas cantar,

Ao som da viola,

Uns versos que trago

Na minha sacola.

Carlos não cantou,

Por que cantarei?

Meu tempo é agora,

Ontem não fui,

Amanhã, serei?...