RUA BOA VISTA (*)
Rua descaracterizada
asfaltada, árida, abafada
ontem anarquista, liberada
hoje mão única, vetada.
Meu playground nos anos 60
onde brinquei dos meus 10 aos 16 anos
menino subversivo e visionário
um anjo incendirário
brincando de chicotinho queimado
encenando no meio da rua
os filmes assistidos nas matinês.
Rua Boa Vista, ontem intimista
hoje exclusivista
ontem romântica
agregadora, platônica
rua dos namorados
das tertúlias e serenatas
das conversas jogadas fora
das piadas improvisadas
hoje é uma rua fantasma
sem cadeiras nas calçadas
enclausurada na televisão.
Rua sem árvores, desértica
cortaram os pés de fícus
morreram as algarobas
sem mais meninos soltando pipas
sem jogo de bola, bilas e botões
O ferreiro Zé Gama se mudou
sua bigorna estridente se calou
Rua abraçada ao progresso avassalador
sem pãozeiro, leiteiro e amolador
Rua das casas sofisticadas, sem quintais
saudade das casas meias- águas
com seus terreiros ociosos, espaços sagrados
para as nossas brincadeiras de bom grado.
Rua conectada no Instagram e WhatsApp,
nocauteando de vez os moleques de recados.
Rua dos motoqueiros, sumiram os carroceiros
e junto com eles os nossos bigus sorrateiros
até os cães da rua mudaram de status
escafederam-se os vira-latas
dando lugar aos buldogues, poodles, dorbemans
e outras raças exóticas caninas.
Cadê a inseparável turma da rua?
Zé Molhado, Deda, Gilson, Gutemberg, Rômulo,
rua sem Levi, Anselmo, Albino , Demontier.
Cadê o marceneiro Otávio e o pintor Zezão?
O guarda noturno Ambrósio não apita mais
com o passar do tempo perdeu a autoridade.
Cadê a turma, os atos, os fatos, ao boatos, os times?
Cadê o meu queridíssimo Quadro de São Luiz?
Lá no Quadro jogando bola com a turma
fui artilheiro, mestre, companheiro, apendiz
Boa Vista, sumiu a Boa, ficou a Vista que não é boa.
Cadê a nossa linda vista?
Cadê a nossa Rua Boa Vista?
(*)-Rua de Juazeiro do Norte-Ceará
Autor: Benedito Morais de Carvalho (Benê)
Poema Revisado