Observa-dor
Olho para minhas dores, com honestidade, verdade e coragem.
Esforço contínuo para não me endurecer.
Esforço estável para que a docilidade, a delicadeza e a entrega ainda resistam ao que quer que tenha tentado me convencer que é inútil.
Olho para a imagem refletida no espelho e vejo como não vi antes.
Olho agora sem o véu da fantasia.
Com lentes mais sensíveis.
Como quem se autoriza...
A viver o amor com leveza e liberdade.
Como quem desloca, movimenta e dá contorno novo.
Como quem se esforça para desprender dos pesos, das dores, dos desamores.
Olho e não só vejo, como enxergo.
E enxergando traço de novo a estrada.
Não só como quem olha.
Mas, como quem olhando, vê.
E vendo, vou aos poucos me curando de mim.
Olho com honestidade, verdade e coragem.
Para me relembrar de que sou projeto inacabado.
Processo que permite ajustes.
Ser-humano-falho-bonito-falho-humano.
E eterno vir a ser.
Olho com honestidade, verdade e coragem.
Como quem se percebe.
Como quem observa-dor.
Como quem se propõe a se acolher com tudo quanto é e deu-se conta de ser.
Olho, sabendo que quando se olha com honestidade, verdade e coragem, não se pode mais viver como quando não se tinha olhado.