O útero
O útero
O útero é o berço primeiro
O argumento da vida, a divindade da mulher.
E a mulher é a deusa da maçã
Do arquipélago interno
Onde flutuam vidas, enigmas e dores.
As dores são as respostas acre
Para as lutas incautas, para a sobrevivência pungente.
Um bicho indomesticável, que não se dobra
Que não vive de sobras.
A mulher tem útero para jorrar vida
Para jorrar sangue
Para jogar fora o que lhe denuncia.
Ela é maré alta, é onda violenta espumando
Não se quebra, não enquanto é vida.
Querê-la é insuficiente querela
Ela é dela, do filho, do jato rubro e quente
De onde jorra sua maldição e sua força.
O útero é sua barriga.
E a mulher já nasce serpente
Cerca, abraça, protege, acaricia.
Ama!
Ama mais que pode, mais que é permitido amar
Ama como se o amor estivesse por terminar
Abraça para sufocar, o que lhe rebenta o ventre
O que lhe santifica. O que lhe suaviza a vida!
Mas o útero também gera o fruto
Da decadência, do espúrio, do estupro
E nem assim ela deixa de se santificar.
A mulher está acima do útero
O útero é a caixinha de segredos de uma mulher
Homens podem lhe visitar quando ela quer
Mas homens não lhe dominam, não lhe sabem
Ela tem mistérios mais profundos
Que sua caixa de pandora pondera.
O útero é seu regalo, regaço, regato.
É sua benesse que a favorece na divindade
É seu colo onde afaga os seus e a si própria
É de onde jorra a sua fonte de saberes.