Conta a história que um palhaço,
Conta a história que um palhaço,
não podendo mais sorrir,
desatou-se de seu laço,
aos colegas deu um abraço
e do circo quis sair.
Ai! Do circo quis sair!
E Silveira, o divertido,
em um Silva transmutou-se.
O seu traje colorido,
o sapato tão comprido,
tudo ao lixo arremessou-se.
Tudo ao lixo arremessou-se!
O nariz, antes sagrado,
a coroa de Silveira,
sobre o armário foi guardado,
num caixote abandonado
desfazendo-se em poeira.
Desfazendo-se em poeria!
"Pobre Silva", já diziam,
"que não pode mais sorrir..."
Todos, todos que o viam
lamentavam-se, sofriam,
pois do circo quis sair.
Ai! Do circo quis sair!
E o Silva, quando os via,
deprimido como estava,
a ninguém reconhecia,
a ninguém um "oi!" dizia,
e com dor se envergonhava.
Ai! Com dor se envergonhava!
Quando, um dia, faleceu,
já ninguém se recordava;
quem morria era um plebeu
como tantos que morreu
sem saber por onde estava.
Sem saber por que rezava!
Encontraram em seguida
um caderno conservado
que deixou por despedida
quando ainda tinha vida
Silva morto e soterrado.
Silva morto e soterrado...
"Fui Silveira, o divertido,
"porém hoje não sou mais.
"Quem sou eu? Qual é o sentido?
"Sou sandeu ou fui traído?
"Saberei isso jamais!
"Saberei isso jamais!"
02/03/2021