Bateria
Não sei exatamente onde deixei meu carregador - ou melhor: não sei quando carreguei tanta dor nessa vida. E o pior é que minha bateria já vive viciada - qualquer carga, fica nas alturas; mas, sem demora, a autoestima abaixa. O brilho se apaga. A cera acaba. A queda de Ícaro!
Caio.
Precipício.
Principal: é preciso carregar a dor... E é primordial alimentar a mente. Minto, é melhor matar o medo - que amordaça a vida e é mais mortal que a morte. Outra, mais outra dose, por favor! Uma grade de cerveja - e a grande satisfação de sentir-se livre das correntes invisíveis da grande engrenagem. O ciclo infindável. Veja o admirável filtro novo. Vede o abominável homem das redes.
Meus ombros latejam, e não é de carregar cimento, tijolos, telhas; sim transtornos, traumas, sentimentos - duros feito concreto de late e latejantes feito saudade. Na verdade, tenho carregado até o que não me cabe, como um cabo incompatível que acaba quebrando o compartimento do celular, e apesar disso ainda carrega;
Como uma escada e um caibro numa casa cheia de cupim, e mesmo assim ainda sustentam.
Sou deslocado de mim e do mundo, estrangeiro...
Como um vinho carreteiro escorrendo do copo de um bêbedo caído na beira da calçada - ou de cachaça.
Estou cansado de tudo, e, embora de luto, luto - e ainda que eu lute, a labuta não é muito, mas é precisa - como o é preciosa a vida - mesmo que descarregada, desgastada, descompensada, descompassada; mesmo que mal vivida...