Alter Ego
O eu
que se esgueira
às janelas
da minha alma
e se põe a versejar
acerca das coisas
que o inspiram,
preza a melancolia
que possibilita
o gozo poético.
Entretanto,
o dito cujo
lacrimeja
quando se depara
com a vil certeza
de que nada
nem ninguém
pode privá-lo
da pungente crueza
que reside o íntimo
de quem nasceu
melancólico.
Seres tristes
conseguem se esquivar
do mal-estar cavalar
que os deixam,
por vezes,
macambúzios.
Já os seres melancólicos...
Ah! Quando sofrem,
eles o fazem fervorosamente,
pois não conseguem sequer
recorrer à minúscula flama
que é a ânsia por viver.
Ainda assim,
é mais fácil
um ser triste
cometer suicídio,
porque é do feitio
do melancólico
perder o juízo.
A tristeza é impulsiva;
a melancolia, meditativa.
O eu
que se esgueira
às janelas
da minh'alma
e se põe a versejar
é de fato um poeta.
Contudo, sente medo
de amar.
Não é por falta de coragem
que ele teme o amor
é por saber que o seu coração
é valente demais e até seria capaz
de amar por dois, sozinho.
Sendo um ser melancólico,
ai dele! Que perigo!
Se o seu coração antigo for,
ainda que levemente, partido,
a dor que provém do luto
pode torná-lo vazio.
O eu
que se esgueira
às janelas
da minh'alma
e se põe a versejar,
não sente medo de amar.
No entanto,
receia que a melancolia,
por ser demasiado intensa,
venha a lhe matar.