O ressuscitado

Estavam todos lá

familiares e amigos

era o enterro de Pedro

o jardim nunca mais veria Pedro

Pedro sempre alegre

um céu aberto nos lábios

Pedro foi um sol

Hoje é saudade

Ernesto estava lá

sempre distante e melancólico

a boca nublada

um coração enclausurado

Ernesto sentia tanta saudade de Pedro

que poderia falar em versos

Amigos levam Pedro

muito choro, consolo,

oração e canção

era tempo de dizer o adeus definitivo

o adeus sem Deus

a vitória da Morte

assim Pedro veria talvez

O Todo ou talvez O Nada.

Ernesto via a cena

o corpo entregue à Morada Definitiva

o fim, o fim, o fim

o fim de Pedro

o fim de Paulo

o fim da angústia

o fim da indiferença

o fim da alegria

o fim do dia

o fim da noite

o fim da manhã

o fim da desesperança

o fim de Santo Antônio das Mortes

o fim do mundo

o fim de Ernesto

Mas como terminar o que não começou

mãos sem amor

boca sem conexão

pernas sem perdição

é possível estar mais morto que o enterrado

e temer pela outra morte

a morte social, documentável,

a única morte possível para Pedro?

O que será de Ernesto?

Estrelas e luas perdidas

erros evitados pela Prudência

(fatal camisa de força)

canções que não foram canoas

Caminha só e pranteia

não tanto pelo morto

mas pela própria vida

Lágrimas são vida

a dor é vida

o coração de Ernesto

irriga canteiros

era tempo, era tempo,

será tempo enquanto houver tempo

Ernesto quer ver o Eterno

antes de mergulhar na Eternidade.