O amor está nas pequenas coisas
Os dias
em minha antiga casa,
quando ainda tinha vovó Zefinha
em seu estado natural,
eram dias completos...
porque vovó
fazia de tudo que podia
para valer a pena
existir aquele dia...
histórias do interior,
histórias de terror (principalmente quando não tínhamos TV),
histórias sobre as dores que
o casamento causou a ela,
quando a necessidade batia à porta,
ela sentava em frente a porta da cozinha,
dentro do café colocava farinha, e dizia:
vamos merendar mais vovó
eu odiava aquela merenda,
mas amava merendar com vovó...
então, a gente merendava café com farinha...
pão com açúcar...
e quando comida não tinha...
vovó pedia para vizinha algo para inteirar
o feijão requentado,
o ovo frito,
a farofa de óleo...
ou juntava pedaços de cebola,
tomate e coentro
ao feijão com farinha e arroz
.... tudo para que o prato de comida não faltasse...
comprava fiado...
sim...
e quando o dinheiro chegava,
ficávamos entre comprar comida
e pagar as dívidas...
um dia,
lhe perguntei o que era o amor...
e com 12 anos, ouvi a seguinte resposta:
-não sei dizer direito, mas acho que a gente fazer a comida que outro gosta
é amor
no dia seguinte,
ela fez a melhor farofa
com caldo de galinha...
e fez porque sabia que a gente gostava...
entendi
que entre a gente
era amor.
e enquanto escrevo sobre vovó
choro...
mas choro de saudade
de sua voz doce
me contando histórias
falando sobre sua vida quando mais nova
me dando bronca...
falando sobre minha bisavó...
"mamãe! mamãe era retada"
"mamãe largou papai naquela época,
voltou a morar no mato"
"sua tataravó se chamava Alfa,
índia do mato, não gostava de agonia...
meu pai caçou mamãe no mato,
mas ela largou ele
quando o ciúme dele começou a sufocar ela"
choro
porque ficamos
anos sem escutá-la
depois que o quarto AVC
lhe fez calar a voz
choro
porque
o dia 11 de junho de 2016
às 18hs
vovó se foi
e
se foi
sem que
sua voz
pudesse ser ouvida...
e por mais que tenha se passado 4 anos...
nossas lembranças e saudade
nos fazem pensar que foi ontem.
o amor está nas pequenas coisas,
mas vovó
será sempre grande
gigante
...
a gente vive com a saudade,
mas não supera
a ida dos nossos amores.