A PERSONAGEM
Não vou criar personagens:
Seria um cego guiando outro;
Não vou inventar um roteiro:
Não haveria rumos a seguir...
Apenas penso em uma história
Que não posso contar
Pois não me atenho a detalhes.
“Conta-se que ela tentou um dia ser feliz,
e que a felicidade lhe foi arrancada pela raiz.”
Ela não tem alicerces
Ela não vai permanecer.
Mas eu sou ela em todo o seu ser
Ela, que talvez nunca eu vá conhecer
Mais do que possa ao menos inventar.
Mas meu desejo me move,
Meu desejo de vê-la criada:
Real
Inventada
Personagem de mil sortilégios
Ela viajava?
Ela dançava?
Socorria?
Sorria?
Não sei...
Sei só que ela insiste em existir
Se não puder recriá-la
Por meio da palavra incerta
Enxertá-la nessa folha,
Se o branco dessa folha
For também vazio e incerto,
Precisarei parar e me recompor,
Voltar ao pensamento
Retornar ao impossível
Reativar todos os sonhos
E continuar vivendo
Essa menina
Cheia de vida
Que dança linda
Pelo salão
Não sabe nada
Por que se finda
A vida plena
Dos que se vão
Pois está viva
Está vivendo
Sorrindo e vendo
O que virá
Mesmo que saiba
Ou que não saiba
O que está sendo
Ou que será
Por horas e horas espero
Que haja espírito nessas palavras
Que se faça carne o espírito
Que seja amor tudo, nisso
Que a personagem enfim se liberte
E então me liberte
De mim
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