O QUE VEJO DA JANELA
Descrevendo o que vejo da janela
Posso, fácil, tirar a conclusão:
O nascente espalhado em quase um metro
Onde avança um comprido torreão
Um trovão eu não vejo, mas escuto
Da janela que eu fico, esse trovão.
Vejo a linda paisagem do sertão
Toda vez que eu escrevo é quem me inspira
Pode não parecer, mas ela é bela
Quem não ver como eu vejo diz: - mentira
E uma serra, de baixa, acocorada
Que foi Deus quem botou e ninguém tira.
Minha vista, no espaço azul, dá mira
Vendo as nuvens fazendo procissão
As estrelas que acendem quando é noite
Sem ninguém apertar algum botão
É de graça, não pifam, nem precisa
De ninguém pra fazer manutenção.
Também vejo meu lastro de feijão
No momento presente está florando
Pés de milho subindo bem de pressa
Cinco palmos do chão se levantando
E um coqueiro sozinho abandonado
Seis se foram, só ele está sobrando.
Vejo um córrego antigo transbordando
Engolido na boca da bueira
Toda água que desce é despachada
Sua queda parece cachoeira
Vejo a cerca de arame em minha frente
E do meu lado esquerdo uma porteira.
Vejo estacas formando uma fileira
E nos cantos, mourões de castanhola
Jitirana que não é tão tirana
Mas por cima do mato ela se enrola
Um baceiro ela forma igual telhado
Solta a flor azulada e branca gola.
Um lajedo pregado sem ter cola
Que já tem vários anos de existência
O seu tipo de rocha, desconheço
Mas me alegro por sua convivência
Mesmo mudo, sem ter locomoção
É um exemplo, pra mim, de paciência.
Também vejo a divina providência
Quando escuto o cantar dum passarinho
Que não planta nem guarda num celeiro
E só leva seu tempo em fazer ninho
Mesmo assim se alimenta, inda recolhe
A comida que leva ao bruguelinho.
Quase em frente uma casa do vizinho
Vejo em pouca distância da janela
Um caminho de terra que caminho
Quando deixo pra trás uma cancela
Que sequer, não cancela, os movimentos
No momento em que saio pra capela.
Vejo um poste a ficar de sentinela
C’ uma luz que se acende avolumada
Passa a noite todinha clareando
A janela que eu fico e a calçada
Só se apaga depois do amanhecer
Quando enfrenta, todinha, a madrugada.
Vejo atento, num fio, a passarada
De manhã, bem cedinho, sem ter frio
Vir buscar o calor do sol nascente
Pra deixar de cantiga um desafio
E a fartura que vejo em minha frente
Não conhece o sentido de fastio.
Mesmo em frente de mim, vejo o baixio
Por ser baixo engrandece a natureza
No seu meio, passando, rasga um rio
Que na cheia faz dele uma represa
Quando é tempo de seca o rio seca
Só restando uma enchente de tristeza.
O formato da caixa, com certeza
É dum cubo e repousa numa serra,
Ouço e vejo o chocalho duma vaca
Toca quando sua boca toca a terra
Pra comer mato verde, e um bezerrinho
Vai no rastro do peito, apoja e berra.
Minha mente, ao lugar, tanto se aferra
Que contemplo no templo natural
Onde o céu forma a cúpula sem torres
Onde a terra é um altar celestial
Todo o belo que existe são alfaias
Consagradas a Deus num corporal.
Vejo o sol no seu palco teatral
Clareando no dia como vela
Vem a noite que leva o claro seu
Para assim demostrar o escuro dela...
Vejo tudo que existe... um paraíso!
Quando tiro o ferrolho da janela.
Baixa Grande 24/04/2020