Não conheço uma verdade

Não conheço uma verdade

não por muitos conhecida.

Não bolei um pensamento

que meu fosse nessa vida.

Não provei qualquer sabor,

não ouvi qualquer canção,

não tracei nenhum desenho,

não senti qualquer paixão.

O que sou, o que serei,

o que fui quando nasci,

nada nisso há de novo,

nem em tudo do que vi.

Não conheço um só pecado

que no mundo cause espanto.

Não conheço uma virtude

que interrompa o humano pranto.

De qualquer pensado antídoto

nossa dor imunizou-se.

Não sobrou um só poema

que um poeta não nos trouxe.

Esse mundo, de tão velho,

quer deixar o seu passado.

Descobrir de novo o fogo,

ver a gente andar pelado.

Ele quer de novo Adão

nomeando os animais,

pois se frustra que hoje em dia

sejam todos tão banais.

Ele quer de novo Eva

mordiscando aquele fruto;

dando-o então ao seu varão

com seu crânio diminuto.

Ele quer impressionar-se

com um homem que juntou

uma pedra a um galhinho

e o machado, assim, criou.

Está farto que hoje em dia

para ver uma invenção

necessite de dinheiro,

uma equipe e instrução;

ou então contentamento

com o pouco original:

uma nova vestimenta,

ou um mimo estomacal.

Nada existe mais no mundo

que não seja repetido.

Nem ao fim dos bons romances,

nem nos olhos de um falido.

Nem sequer quando eu nasci

e de susto alto chorei,

nem sequer quando no colo

de mamãe eu me acalmei.

Nem sequer quando meu pai,

assombrado de me ter,

acolheu-me nos seus braços

e jurou me proteger.

Nem sequer naquele dia

quando a vi em vasta glória

meu amor foi diferente

de outros tantos pela História.

O meu nome de batismo,

nem sequer meu santo nome!

Nem sequer essa aflição

que a inúmeros consome...

10/12/2020

Malveira Cruz
Enviado por Malveira Cruz em 10/12/2020
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