POETA NO CEU MORANDO

Olha, tantas almas e um só caminho,

tanta sede dos opressores e um só vinho,

se houvesse um deus celeste logo acima

não permitiria que morte e dor fossem rima...

Olha, tantos braços estendidos sem nada alcançar,

o brilho do alumínio do prato, intenso, a cegar,

se houvesse anjos no espaço sideral, voando,

não hesitariam em virem até aqui, pousando...

Olha, tantos olhos secos de chuva e de areia,

miúdos seres avoando pensamentos, a ceia

onde a paz se sentará no lugar de honra,

pão, a faca, só luz, olhos límpidos, sem sombra...

Olha, quilômetros de astúcia, de cego desejo,

a pele da criança sem a coloração do medo,

a arca do futuro carregará a ciência que cria

os novos poetas, guerreiros, a nova poesia...

Olha, por acaso o homem tomou o timão,

por acaso ergueu a si o cálice da ilusão;

se houver um poeta lá no alto céu morando,

a história do homem escreve, hoje, chorando...