Afundar

Divido-me entre o prazer e o estrago

em cada trago que dou.

Sinto-me dissipar como a fumaça do cigarro,

enquanto escarneço do que sou.

Sou feito de carne podre e poesia sofrida,

cujas cicatrizes zombam de minha ferida,

a cada sorriso que ouso fingir.

Uso pílulas pra não sentir e pra dormir...

Trago em minhas entranhas

sensações estranhas

de um ser que nunca serei...

Sonharei ainda como uma criança,

e sempre atormentado acordarei

ao presenciar a morte da esperança...

Esta não é e jamais será a última que morre.

Vivo já pensando em beber o próximo porre,

pra suportar a dor  de morrer a cada pestanejar.

Solitário como um barco em alto-mar,

vago sem bússola, nem remo,

mas só, com meus remorsos,

meu vinho, meu veneno,

e meus inúteis esforços

de não afundar.