Meu exercício com sonetos que foram revisados pelo poeta amigo, o incomparável sonetista, Marcos Aurelio Vieira

Escrever sonetos sempre foi um sonho que acalentei, mas sem sucesso. Trata-se de uma composição clássica, de gramática poética exigente, de versos nos quais o poeta enfrenta um conflito entre a inspiração e as normas. Considerava um desaforo que o Soneto fizesse birra comigo. E eu ali, ao pé dele, fervorosa. Resolvi comprar a briga, fazendo um exercício de compor sonetos. Eu só não me envergonho mais deles porque poemas são filhos e devemos amá-los incondicionalmente.

Graças a Deus e às divindades poéticas, encontrei o amigo sonetista, Marcos Aurelio Vieira, anunciando que trabalha com a revisão de sonetos! Aqui está o resultado da minha tentativa e da bondade e cavalheirismo do poeta Marcos, pois o recomendável seria ele me dizer que desistisse, que não fizesse mal aos sonetos. Perdão por ter me atrevido...

BRAÇOS, BARCOS VELEIROS

Meus braços não mais resistem _ porquanto

Fracos, desajustados flecha e arco,

Nos mares são perdidos vela e barco

Carregando tristeza e desencanto.

Sem comando, sem roteiro, entretanto,

Seguem o traçado destino _ marco

Do desatino em qual nest’ora embarco

Velejando infinito mar de pranto.

Ai, quem os avistasse antes erguidos

Chorava de vê-los assim feridos,

Rodopiando em círculos concêntricos.

Meus braços, velas rotas, arriadas,

Velhos veleiros, antigas jangadas

À fria imensidão d’um cais idênticos.

INVARIAVELMENTE

Cruel amar, invariavelmente,

Entre loucura e razão navegar:

Esse delírio povoando a mente,

No subjetivo deixar-se afundar.

Em sendo assim percebo claramente

Amor _ déspota livre em seu voar.

O amante é um escravo tão somente,

Outra coisa não faz mais que falhar!

Paixão a dominar o humano ser,

Cega-lhe razão, sobra o seu instinto,

Campeando nos átrios do sofrer.

Irônico e mordaz, Amor, querer!

Tripudia, destrói a paz _ não minto...

Satisfeito ficará se eu morrer.

TELA

Era um quadro artístico mavioso:

Ecoava no sonho a canção d’anjos,

Sons de violinos, violões, banjos...

Sim, o mais divino sonho amoroso!

A visão, tal um espelho mimoso,

Cristalino lago cheio de arcanjos,

_ Cena d’idílio_ envolto de arranjos,

Um entre todos era o mais formoso.

Ser ao qual me refiro e loas teço,

Sorriso d’um deus, (ai!) eu não mereço

Em seus olhos brilhava a luz solar.

Tomou-me pela mão _ oh, que juízo!

Pelos prados sem fim do Paraíso,

Abraçados, amor me fez jurar.

“TO BE OR NOT TO BE _THAT’S THE QUESTION” (W. Shakespeare)

(dedico a todos os amantes do soneto, mas antes peço perdão pela ousadia)

“Ser ou não ser – eis a questão” do mundo

A se negar, perder-se em torvelinho,

Afundar nesse pântano acre, imundo

Observando-lhe as rotas no caminho.

Nessas estradas nós andamos juntos,

Lembrando-nos de ser o que não somos,

Esquecendo-nos de que somos muitos

_ seres d’amor e luz que nunca fomos.

Sim, somos e não somos coisa alguma,

De ser gente recebemos a alcunha.

Importante questão a resolver ...

E continua séculos afora:

_ se somos ou não somos isto d’ora

Se somos ou não somos ‘té morrer!

VERSOS ADVERSOS

Tento, por teima, sonetos compor,

Belas composições de presos versos,

Em tamanha grandiosidade imersos,

Que por mim jamais sentiram amor.

Bem ou mal, sei, enfrento brava lida

Contando sons nos dedos sem cessar.

Esqueço lua, sol, gaivota e mar

Nem que de morte sangre esta ferida.

Pelicano de Musset, te ofereço

Amor eterno, corpo e alma e apreço,

Esvair-me, afinal, neste penedo.

Em troca nada peço, imploro, exijo.

Não me incomoda teu abraço rijo

Eu te amo, sim, de ti não sinto medo!

CANTO E DELEITE

Não almejo acariciar teu peito,

Nem o meu ao teu tocarei um dia!

Coração repleto d’amor daria

Ao proibido foro de direito.

Jamais dividiremos calmo leito,

Seja em manhã quente ou na noite fria.

Acalanta Minh ‘alma esta agonia

Na qual, sofrendo, canto e me deleito.

Não t’importes, querido, sou feliz,

Ah, dúlcida ilusão _ una esperança!

A vida levo em formosura e festa,

Sigo vivendo, cantando m’ia sina,

Ora o canto acerta, ora desafina,

Sustentado no sonho que me resta.