[Alguém Vigiou meu Sono]
[Alguém curvou suas costas atentas aos resíduos de outras vidas — Ecléa Bosi — Memória e Sociedade: Lembrança de Velhos]
Era alguém que se preocupava em abrir-me
caminhos por entre sofrimentos;
sim, alguém que deu a sua vida por mim,
toda não, pois isto seria impossível,
porém, o bastante para o esmorecimento
do corpo, das forças — mas não da vontade!
Alguém tentou, com um notável esmero,
encher a casa do carinho de flores frescas,
brancas toalhas, forros imaculados,
cortinas lavadas com frequência,
e a nossa cama arrumada com amor.
Confiante de que me teria,
alguém sujeitou-se, paciente,
aos meus destemperos,
às minhas mãos vazias de carinho,
aos meus lábios frios, impassíveis,
aos meus descuidosos olhares,
e até aos meus arroubos com outras mulheres.
Alguém suportou todos os maus tratos
dos recorrentes traumas de um passado
oneroso e sem as pegadas dos seus caminhos.
Alguém...
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[Penas do Desterro, 16 de novembro de 2005]