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O problema é que morrer não dói
morrer cansa. Tantas mortes diárias, rotineiras, coisas do dia a dia
da vista do tempo pela janela desta sala, cada dia o tempo contemplando as pequenas mortes
das dores, tu sobreviverias, é fácil achar remédio para essas feridas, de carne, de humanos, de dentro também, do de dentro de ti, porém,
a casa silenciosa, a mesa posta, as flores regadas, tudo em seu lugar,
do quarto limpo, da mala feita, dos morangos sobre a mesa
destes espetáculos derivados do tempo nunca se escapa
se morre, todo dia, tempo é fenda, é sobro, é assombro
é os olhos decaídos no espelho, o batom sem cor da polpa daquele vão
que um dia foi um corpo, no mundo, morrer não dói,
mas a gente vai acarretando um cansaço dos dias, das cinzas, das horas
o sol perde a cor todo dia, a gente olha, sente um assombro e
sente o cansaço de pressagiar mais uma morte diária.