O vivo fantasma do poeta

O vivo fantasma do poeta

Um poeta eu fui...

Hoje sou apenas um fantasma!

Ao qual as pessoas escondem o olhar.

Ao qual a sua própria família evita!...

Evita para não ter que lhe dar uma chance na vida.

Lembro assim de mim nesses ratos molhados...

Fugindo entre gazes e buzinas que gritam,

roucas!

Automóveis e ônibus, e homens ululantes nas avenidas do mundo...

Nós escritórios e fábricas...

No lodaçal endurecido,

piche negro dos asfaltos.

E esses ratos, esguichando o seu mijo nas sarjetas...

Escondem em si mesmos a poesia mais dura.

Que nunca ganhará a atenção dessas academias

Nem prêmios literários nem gorjetas.

Ratos e homens olvidados!

Com os seus olhos acesos no escuro...

Onde os faróis dos carros se deixam.

Um pedestre impávido

Entre o estrupir dos motores

Movidos a combustíveis fósseis.

Neste vasto inferno!

Esquadrinhado de dúvidas

Fantasma real de um poeta que chora.

Onde os homens se desdobram de si mesmos.

Na sombra e no pretume desse mundo.

Neste entardecer de morcegos noturnos.

As buzinas vaiam-no irritadas!

Ao cruzar as faixas desse asfalto mudo.

Xingado ele vai com seu nome na lama

Onde os ratos famigerados e fétidos pacientemente procuram seu jantar.

Francisco Cavalcante