O CANTO DA VIDA
O canto da vida me fez tinhoso,
ranheta, cabra duro na queda,
do tipo que enverga e não quebra,
do tipo tanto bate até que fura,
do tipo que não morre na praia.
O canto da vida me deixou chão íngreme,
de pele dura, de voz não servil,
de sangue faminto por novas veias,
por novos portos, por novos chegares.
O canto da vida me talhou calejado,
de alma aguerrida, aprumada,
de fé desconfiada, aguçada, atiçada,
de certezas que mal cabiam em mim.
O canto da vida foi mãe e madrasta,
foi chute e âncora,
foi limo e seda,
foi suave e sopetão,
foi paz e breu,
foi gozo e desdém,
foi valsa e tiro,
foi dádiva e troco,
foi fervura e brisa,
foi bênção e maldição.