CORPO ESTRANHO
CORPO ESTRANHO
Se me entristeço
Talvez seja sinal dos tempos
Não de mudanças
Mas de mutações
Caros valores estão
Virando pechinchas
Caros princípios
Estão virando fim
O espetáculo não para
Como conservador
Sinto-me no formol
Um corpo estranho
Ultrapassado ex modernista
E até onde alcança a vista
Deslocado de futuro
Um passivo do passado
Não tão longínquo
Mas tão jurássico
Engrenagem oxidada
Pelos novos tempos
Tão instantâneos
Sem integralidade
Perdido num planeta
Sem luz própria
Abomino-me circunstancialmente
Num mundo cada vez mais artificial
A caminho da inteligência artificial
Perco cada dia mais força
Corro grande perigo
Mas não me amedronto
Apenas entristeço-me
Pelo passar do tempo e do espaço
Com tanto progresso
Paradoxalmente tanto retrocesso
Logo será a partida
Ida sem volta
Mas grande alívio
Por total inabilidade
Em conviver cada vez mais
Com superficialidades
Sem pensamento profundo
Sem relacionamentos duradouros
Com esperanças apenas materiais
Como se coisas substituíssem
O coisinha que sempre fui