CORPO ESTRANHO

CORPO ESTRANHO

Se me entristeço

Talvez seja sinal dos tempos

Não de mudanças

Mas de mutações

Caros valores estão

Virando pechinchas

Caros princípios

Estão virando fim

O espetáculo não para

Como conservador

Sinto-me no formol

Um corpo estranho

Ultrapassado ex modernista

E até onde alcança a vista

Deslocado de futuro

Um passivo do passado

Não tão longínquo

Mas tão jurássico

Engrenagem oxidada

Pelos novos tempos

Tão instantâneos

Sem integralidade

Perdido num planeta

Sem luz própria

Abomino-me circunstancialmente

Num mundo cada vez mais artificial

A caminho da inteligência artificial

Perco cada dia mais força

Corro grande perigo

Mas não me amedronto

Apenas entristeço-me

Pelo passar do tempo e do espaço

Com tanto progresso

Paradoxalmente tanto retrocesso

Logo será a partida

Ida sem volta

Mas grande alívio

Por total inabilidade

Em conviver cada vez mais

Com superficialidades

Sem pensamento profundo

Sem relacionamentos duradouros

Com esperanças apenas materiais

Como se coisas substituíssem

O coisinha que sempre fui

Arnaldo Ferreira
Enviado por Arnaldo Ferreira em 05/07/2020
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